sábado, 8 de outubro de 2016

Successive Slidings of Pleasure (Alain Robbe-Grillet, 1974)

Uma artista adolescente é presa por supostamente ter assassinado a mulher mais velha com quem vivia. Se por um lado esta insiste que um estranho entrou no apartamento e terá cometido o crime, apesar de lhe pertencer a tesoura usada como arma, por outro diverte-se com a atenção que lhe é dedicada pelo detetive da polícia, o juiz local, o padre e as freiras da prisão, inventando histórias de prostituição, sadomasoquismo e lesbianismo para os chocar – e aos espectadores, diz mesmo uma personagem.

Com Robbe-Grillet as coisas nunca são fáceis de decifrar. Aliás, são propositadamente impossíveis e quando começamos a tentar descobrir o que é verdade e o que é mentira no contexto do enredo é quando o autor passa a ter-nos na mão, porque no cinema tudo é uma ilusão. Assim, é permitido o inexplicável. Successive Slidings Of Pleasure assemelha-se a um labirinto com infinitos becos sem saída e no fim volta-se à entrada. Através de padrões, motivos e repetições somos chamados à atenção para palavras, atos ou objetos que podem ter implicações palpáveis para o caso ou valor puramente surrealista.

A certa altura, o juiz e a adolescente testam-se através de livre associação. O que se conclui através desse método de psicanálise parece ser vago e condicionado pelo que se procura naquilo que se ouve, e cada um procurará algo diferente consoante a sua sensibilidade. Da mesma forma, a pá encontrada num armário pode ou não ter relação com a pá do coveiro que enterra uma amiga da escola. Pela masmorra de tortura medieval em uso pelo clérigo pode estar a ser estabelecido um caso real de maus tratos, um paralelismo simbólico com as bruxas de antigamente ou uma fantasia sexual perversa. E por aí fora.

Tal como em Eden And After, a nudez e a violência são constantes, andam de mãos dadas e têm tanto de perturbador como de fascinante. Robbe-Grillet preenche cada frame de película com a mesma duplicidade de cada página dos seus textos. Ninguém cria um enigma como ele, ou não estivéssemos a falar da pessoa que escreveu Last Year At Marienbad (1961). Hostil à ideia de uma narrativa, em Successive Slidings Of Pleasure constrói outra vez um mundo de provocações intelectuais aberto a todas as interpretações.

8/10

Sem comentários:

Enviar um comentário