sábado, 1 de novembro de 2014

Candyman (Bernard Rose, 1992)

Logo à cabeça, duas grandes razões para ver este filme de terror: Clive Barker e Bernard Rose. Candyman parte de uma ideia original do primeiro, um dos maiores escritores vivos do fantástico, que também passou com sucesso para o cinema com Hellraiser, e foi realizado pelo segundo, o mentor do criminosamente subestimado Paperhouse. Quando os créditos iniciais começam a rolar e, de fundo, ouvimos a mais assustadora trilha de Philip Glass, dominada pelo órgão, e imagens de Chicago vista de cima, numa espécie de distorção da abertura de West Side Story, passando-se logo a seguir para um zoom in numa colmeia com a voz distorcida da entidade do título a falar em derramar sangue, fica-se logo com pele de galinha e colado à cadeira.

Helen Lyle está a elaborar a sua tese, sobre mitos urbanos. Fascinada com a história de Candyman, um espírito assassino que aparece com um gancho afiado no lugar duma mão, investiga, sem zelo, a sua ligação ao problemático bairro Cabrini-Green, um projecto de habitação enorme. Apesar do cenário citadino intimidante, a história remonta ao tempo da escravatura, dando ao filme um óbvio subtexto de perpetuação do racismo na América. Helen vive num prédio de luxo mas feito com a mesma planta, contacta com uma mulher da sua idade que é mãe solteira, num jogo de espelhos a nível do argumento, e, no fundo, temos um afro-americano demoníaco a perseguir uma branca estudiosa.

Com vários mal-entendidos e encontros sobrenaturais à mistura, a violência começa a suceder-se e, ao fim de meia hora, o rumo passa a ser completamente imprevisível, bem como o comportamento de Helen, que primeiro é espancada, depois é acusada de matar um bebé e ainda sofre outros reveses a nível pessoal. Como se já não bastasse ser das mulheres mais bonitas a aparecer no cinema, Virginia Madsen dá uma das melhores interpretações de sempre. De sempre. A sua personagem leva tanta porrada, física e psicológica, e a actriz passa por tantos estados de humor com uma credibilidade tal que não me resta alternativa senão fazer esta afirmação. O strip forçado na esquadra da polícia é brutal, porque o procedimento assim o exige, mas está no ar um tom de condenação e humilhação pesadíssimo.

A figura de Anthony Todd como Candyman é intimidante e seria difícil imaginar outro actor no papel, até porque as sequelas solidificaram essa imagem de um gigante com olhar ameaçador. Há alguns piscar de olhos a Hitchcock: o tema das falsas acusações, o crescendo de tensão com reviravoltas inesperadas e até a protagonista loira. Rose consegue também ser extremamente criativo com a selecção dos planos e dar ao filme um tom cruel quando necessário, para além do ambiente de terror urbano. Se, depois de Psycho, entrar no chuveiro nunca mais é a mesma coisa, depois de Candyman olhar para o espelho também deixa de ser tão inócuo quanto isso.

8/10

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