sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

A Credibilidade dos Óscares

Chegamos àquela altura do ano. Não, não é o Carnaval, ainda que também esteja já aí à porta, mas por acaso estava a pensar nos Óscares. Na sua 86ª edição, os prémios da Academy of Motion Picture Arts and Sciences (AMPAS) estão mais do que estabelecidos como os mais vistos, os mais desejados, os mais concorridos, os mais glamorosos, os mais comentados do cinema… e os mais criticados. Que se tornaram na referência pela qual o sucesso (ou, pelo menos, a popularidade) de um filme é medido não dá para contornar, especialmente no ramo dos actores, que levam a sério mais do que ninguém a atenção prestada aos seus esforços sobretudo individuais (um quarto dos votantes são actores). Academy Award Winner ou Nominee passa quase a constar do bilhete de identidade, precedendo o nome em apresentações, trailers ou posters. A fama e as ofertas são atractivas, mas os Óscares, pela sua longevidade, representam um lugar garantido no panteão da sétima arte. Saber que o Titanic podia bater o recorde de onze vitórias em 1998 de Ben-Hur fez 57 milhões de pessoas sentarem-se no sofá. A vontade de ver uma jovem tornar-se a segunda mais nova de sempre a ganhar Melhor Actriz fez de Jennifer Lawrence must-see TV em 2013. Isto tem tudo mais importância porque a história já pesa em cima desta cerimónia e, num meio onde o valor é subjectivo, as comparações são a melhor avaliação.

Contudo, por cada onda de entusiasmo e expectativa parece haver outra de detracção, e as razões costumam ser variadas. Os apresentadores tipicamente dividem opiniões. O espectáculo é longo demais. Os nomeados deixam candidatos amados pela opinião pública ou pela crítica de fora. Os vencedores são amiúde aborrecidos ou demeritórios. Sinceramente, assumo-me como fã dos Óscares, seguidor de todo o buzz que os rodeia e faço a directa da praxe quando chega Fevereiro/Março para acompanhar a emissão, mas dou todos esses argumentos de barato… excepto o último. Nem toda a gente precisa de dar o mesmo peso a esta tradição, nem toda a gente precisa de se deixar contagiar pelo escape que proporcionam, qual extensão da própria irrealidade do cinema, agora, apresentar como argumento contra uma suposta falta de credibilidade nas votações não é realista. A AMPAS conta neste momento com 6000 membros, com conhecimento vasto e de todos os cantos do planeta.

Que sistema pode ser melhor do que o voto democrático de uma população tão grande? Certamente não é o dos Globos de Ouro, que são decididos por 90 jornalistas estrangeiros que só têm de viver na Califórnia e publicar, no mínimo, quatro artigos anuais, podendo passar o resto do tempo na praia. Gosto muito dos festivais e sigo com atenção o que é apresentado em Cannes, Berlim ou Veneza, mas a universalidade dos filmes que por lá passam é relativa, afinal são selecionados por comités anónimos e premiados por um júri rotativo e exíguo. É verdade que há lobbys em Hollywood, se não fosse a insistência de Harvey Weinstein, com campanhas agressivas de publicidade e festas de arromba, em 1999 Shakespeare In Love talvez nunca tivesse sido Melhor Filme – talvez. Comprar tantos votos não é assim tão linear, e até nesse caso houve outros factores contra os (agora) melhor recordados Saving Private Ryan e The Thin Red Line, como a falta de burburinho típica quanto a filmes de guerra e o lançamento do vencedor em Janeiro e não no Verão. Michael Haneke é um crítico violento e consistente da indústria americana, mas foi reconhecido pelo seu mérito artístico em 2013. Dizer que os Óscares têm perdido o seu relevo porque o filme preferido da Maria Josefina não ganhou no ano passado nem o Citizen Kane quando ninguém estava preparado para o seu impacto é redutor. A maioria de um grupo enorme escolheu outro. Não é difícil de aceitar. Se isso não for consolo suficiente, no mínimo just sit back and enjoy the ride – ver alguém ser reconhecido pelo seu trabalho com ouro, admirar a namorada nova do George Clooney e ouvir umas piadas não é assim tão mau.

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