sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

The Hobbit: The Desolation Of Smaug (Peter Jackson, 2013)

Que três livros resultem em três filmes, é compreensível. Agora, um livro dar três filmes, isso já pode causar alguma impressão. Especialmente numa altura em que Hollywood se inunda ano após ano com remakes, sequelas e prequelas da treta e tenta espremer ao máximo o sumo de tudo o que parece minimamente rentável no imediato, o receio de que Peter Jackson poderia ter aderido ao capitalismo cego, dez anos depois de Lord Of The Rings, e manchasse o currículo ao decidir voltar áquilo que o havia elevado aos píncaros e reservado um lugar na memória da sétima arte era realista. Fui ver o primeiro tomo desta nova aventura reticente e saí da sala com sentimentos contraditórios: se por um lado, em An Unexpected Journey, fica evidente que o realizador não perdeu o toque de Midas no que diz respeito a criar cenários e sequências de ação que fazem cair o queixo (aquela fuga dos goblins, wow), o argumento arrastava-se para apresentar tudo e todos com detalhe aparentemente desnecessário e nunca atalhar a viagem, antes pelo contrário. Confesso que sentira o mesmo com The Fellowship Of The Ring, até os outros episódios lhe darem mais sentido, por isso aguardava por The Desolation Of Smaug com expectativa.

Efectivamente, este agradou-me muito mais. O enredo adensa-se à medida que o grupo composto por Gandalf (aqui ainda cinzento), Bilbo Baggins (corajoso e perspicaz), Thorin e os restantes anões se aproximam de Erebor, a montanha solitária, para reconquistar o território que lhes foi roubado pelo dragão Smaug anos antes. As ligações ao que acontece em Lord Of The Rings surgem em maior quantidade, afinal apenas 60 anos separam essa trilogia de The Hobbit. Ficamos, por exemplo, a saber que Gimli é filho de Glóin, reencontramos Legolas e explora-se, numa das cenas mais negras de The Desolation Of Smaug, a origem obscura dos Nazgul, cujas campas Gandalf descobre estarem vazias. Forças malignas reúnem-se em Dol Guldur, lideradas por um necromante misterioso.

A nível de fotografia, é talvez o trabalho mais complexo e variado de todos os episódios Jackson/Tolkien. Desde as imagens da cidade do lago ao verde fluorescente de Mirkwood, visualmente é impossível não ficar satisfeito. A introdução de Tauriel é positiva (claro que, para pôr isto em perspectiva, eu via 50 horas seguidas só de close-ups da Evangeline Lilly): inexistente nos livros, a elfo traz frescura e um capítulo sobre como o amor inter-espécies pode ser possível. Se a interacção de Bilbo com Gollum era o ponto alto do primeiro, o contacto agora com Smaug não fica nada atrás, é intenso e acaba num cliffhanger antes dos créditos finais. O dragão tem uma personalidade sibilina e é imponente pelo tamanho, aspecto, vontade de matar e pelas previsões que executa.

O que de mais importante Peter Jackson tem conseguido com a adaptação do mundo literário de Tolkien é recuperar a magia do cinema, que, ironicamente, parece esvanecer-se à medida que a tecnologia permite criar imagens e sons cada vez mais espectaculares nos blockbusters modernos, ultrapassando todos os limites do possível. Não que Lord Of The Rings e The Hobbit não dependam desses avanços recentes, como é óbvio, mas o que os separa de tudo o que se tem visto no cinema comercial deste século, para além da inigualável imaginação do seu criador primordial, da singularidade das personagens e da solidez das histórias que tinha para contar e que se cruzam invariavelmente, é o puro entusiasmo que o realizador neozelandês tem pelo que está a fazer. Pelo meio de tantas paisagens de cortar a respiração, dos melhores efeitos especiais, de horas e horas de momentos épicos, pressentimos o sonho de um rapaz a tornar-se realidade, um leitor juvenil a folhear páginas avidamente, a planear durante anos a logística necessária para um dia as conseguir filmar, mostrar ao mundo quão longe a sua imaginação viajou, fazer justiça à(s) obra(s) que o tocaram irreversivelmente, e... a conseguir.

8/10

2 comentários:

  1. Gostei, mas desiludiu-me porque gostei mais do primeiro tomo. Consegue a proeza de levantar algumas dúvidas sobre a necessidade de três filmes para a história de um só livro (coisa em que nem sequer pensei quando assisti ao primeiro filme, ainda que muito lhes apontassem o dedo por isso). É ainda assim um grande filme de fantasia e de aventura. Resta-nos esperar pela incógnita da terceira e última parte.

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema
    A crítica a O HOBBIT - A DESOLAÇÃO DE SMAUG aqui:
    http://cineroad.blogspot.pt/search/label/O%20Hobbit

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    1. Concordo com a última parte, e também que parece justificar um pouco a divisão em três partes, mas daqui a uns meses falamos :)

      Obrigado pelo comentário, Roberto!

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