quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A Christmas Carol (Robert Zemeckis, 2009)


Presumo que pouca gente se lembrará, mas num qualquer Natal na primeira metade da década de 1990 saiu em VHS com o Diário de Notícias a versão animada de 1982 de A Christmas Carol. Lembro-me bem de ver o filme duma ponta à outra, fazer rewind no leitor e repetir o processo ad infinitum, fascinado pelo negrume melancólico das cores usadas e da mente de Ebenezer Scrooge, sempre pontuado por pequenos momentos de humor e rematado com o conforto da esperança. Mais tarde viria a descobrir o livro e a encontrar nas palavras de Dickens um reduto maior do que quaisquer imagens podem deslindar.

Ao saber que Robert Zemeckis se ia aventurar a realizar a sua própria visão deste conto, não pude deixar de ficar apreensivo. Não é que possam haver grandes dúvidas sobre a sua capacidade, depois da qualidade da animação de Polar Express e Beowulf, mais cliché, menos cliché nas histórias - simplesmente uma produção de Hollywood desta envergadura de um clássico da literatura aumenta a possibilidade de ser mais vista e definitiva que as que se lhe antecedem. Ao longo dos anos, muitos foram os filmes feitos à volta do Natal de Dickens, que esperar agora deste?

A abrir, um grande plano de Marley num caixão, com pennies no olhos. Jim Carrey aparece então, irreconhecível, de queixo saído, nariz pontiagudo e meio corcunda, debaixo de gráficos de computador topo de gama, como Scrooge, forçado a pagar o funeral do seu sócio defunto, e o carácter do velho arrieiro é imediatamente revelado: contrariado, tira duas moedas da sua carteira para o dono da funerária e, antes de sair, tira também as moedas do rosto do cadáver para a sua carteira. Segue-se um prodigioso plano-sequência pelas ruas e sobre as ruas da Londres invernal do séc. XIX enquanto rolam os créditos iniciais.

Scrooge é somítico e deprimente. Não acredita na essência do Natal, acha que todos os homens são inerentemente maus e conformistas e escolheu há muito tempo isolar-se do mundo com a sua fortuna. Por isso não é surpresa quando recusa ir passar o serão a casa do seu sobrinho Fred (a única família que tem), quando recusa dar dinheiro a uma instituição de caridade e quando maltrata verbalmente o seu funcionário Bob Cratchit por ter de lhe dar folga no dia 25 de Dezembro. À noite, 3 fantasmas visitam Scrooge para lhe lembrar quem foi, mostrar no que se tornou e qual pode ser o seu destino.

A história, sobejamente conhecida, é respeitada e desenvolvida com um ritmo rápido, com Zemeckis a criar cenas de ação para as transições entre passado, presente e futuro, que acabam por resultar bastante bem e não comprometer a melancolia dum enredo simultaneamente linear e anacrónico, um mecanismo que justifica parte do louvor dado a este conto. A assombração de Marley anuncia de forma assustadora uma viagem pelo tempo que se espera ser suficiente para mudar o negativismo de Scrooge. Imaginei-me criança e a sentir-me, tal como ele, afetado pelas imagens macabras evocadas pelo último espectro.

Mas esse é o poder do Natal e o poder do cinema, dois conceitos elevados, capazes de elevar o espírito e de oferecer sobressalto, perspectiva e conforto. Filmado em IMAX 3-D e através de motion-capture, o filme de Zemeckis consegue oferecer um retrato vívido dos contrastes da época, consegue estimular os sentidos do espectador com belos planos, cores e diálogos e consegue gerar um Scrooge memorável, auxiliado pelo talento de Carrey para criar personagens. A Christmas Carol é uma história eterna de redenção que, seja em livro, no cinema, na televisão, em VHS, DVD ou BD, vale sempre a pena revisitar.

8/10

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